segunda-feira, 1 de setembro de 2008

luliX pandaglia - artista móvel
Por que me intitulo dessa forma?
Através do meu telefone celular, me descobri um tipo de artista gráfica, multimídia. Comecei fazendo umas fotos, interferindo nelas, com os recursos gráficos disponíveis no celular, inserindo textos próprios, de alguns autores consagrados, trilha sonora e textos falados por mim. É uma forma de expressão espontânea tecnológica, virtual, totalmente conectada com os dias de hoje, com o Sec. XXI. A cada descoberta e criação, percebia a influência de um artista. O mais significativo para mim foi o Andy Warhol, o pai da Pop Art.
Imagens, textos, sons móveis, instantâneos, espontâneos, e provavelmente, descartáveis, mas sempre com a possibilidade de armazenamento digital, ou seja, compossibilidade permanência e registro.

Podemos através dessa incrível tecnologia móvel, fazer arte, criar, afetar e ser afetado, despertar e ser despertado: brincar, educar. Uma outra estética: a do celular. Qualquer um que possua um aparelho que tenha função multimídia pode receber essa forma de arte, e de graça. Tanto as operadoras quanto os fabricantes desses aparelhos poderiam bancar e incentivar esse tipo de iniciativa artística.
Assim como Galileu e Freud, a tecnologia também marcou um novo paradigma que mudou radicalmente a forma de nos relacionarmos com as pessoas e com o mundo. Quantos benefícios graças a essas tecnologias. O computador que permitiu que mapeássemos o nosso DNA, as novas drogas que possibilitam o prolongamento de nossas vidas. Clonamos! Pesquisamos células tronco, com o intuito de transplantarmos órgãos, com compatibilidade total. Isto é incrível! Algo nunca visto pela humanidade.

Com o computador e a internet, rompemos as barreiras do tempo e espaço. Podemos nos comunicar com qualquer pessoa no mundo que possua um aparelho conectado na rede. E o celular atualmente já desempenha o papel de computador pequeno e móvel, o que facilita muito a nossa vida corrida, urbana e globalizada. Mesmo quem mora fora dos centros urbanos, também tem disponível essa tecnologia que os aproximam, que nos aproximam uns dos outros. Aproximação intensa entre as pessoas.
Essas foram algumas reflexões que me motivaram a desenvolver esse projeto intitulado arte móvel: Imagens móveis, poemas móveis, Cel. de poemas ou cutucarte. O celular, o computador, a comunicação, a arte, o conhecimento e o afeto a serviço da evolução dos seres humanos.

Uma breve reflexão sobre essas duas frases:

1- “A única coisa fixa que eu tenho na vida é o celular.”
2- “Quando estava presa em casa doente, ganhei mobilidade com o computador.”

Essas duas frases escancaram as nossas contradições. Revelam o quanto nada é absoluto, fechado ou seguro. Os múltiplos significados de uma mesma coisa.
A estabilidade encerra em si mesmo a noção de instabilidade. Esse paradoxo revela a impermanência das coisas, a vida em constante mutação... Por isso, temos tanta necessidade de controlar a vida, mas ela nos escapa, “escorre pelas mãos”.
Como pensar a nova tecnologia móvel, o celular, que levamos para qualquer lugar, como a única coisa fixa na vida de uma pessoa? O que é fixo não muda.?!
O telefone celular pode significar para alguém, segurança, solidez, permanência, eternidade. Pode também representar a alegria de falar com as pessoas que amamos, possibilitando a ilusão de controle e de posse.
A princípio essa frase pode soar estranha, sem nexo ou coerência. Ela descortina o nosso medo diante das mudanças da vida, a necessidade de segurança. Medo da morte, da dor, doença, velhice e impotência diante dela. A angústia de viver nossos conflitos e miséria humana.
O celular é um objeto inanimado, “cheio de vida”, que não tem sentimentos, arroubos e complicações. Podemos ouvir através dele uma série de pessoas com histórias alegres ou tristes, receber todo tipo de notícia. Mas, um aparelho não ri, chora, agride ou morre. Ele quebra, tem conserto, e se não tem, é facilmente substituído por outro, mas uma pessoa não.
Através dele nos comunicamos a qualquer hora, nos lugares mais inusitados, invadindo os espaços públicos, com conversas privadas. Essa genial engenhoca facilita e agiliza ainda mais a nossa vida, permitindo receber e transmitir qualquer tipo de informação, sem hora e local marcados.
O celular também significa status, poder. Somos controlados e controlamos o tempo todo. Poderemos atribuir um grande valor, dependendo da relação que estabelecemos com ele.
Vivemos num país em que o sonho da casa própria está cada vez mais distante. Já o telefone celular próprio, pelo contrário, cada dia que passa, mais pessoas possuem esse aparelho, dando a idéia de que somos donos de alguma coisa importante, concreta e fixa na vida.
A maior parte das pessoas não sabem e não se interessam em conhecer outros recursos disponíveis nesses aparelhos. Se nós soubéssemos utilizar melhor essa tecnologia, certamente faríamos outras escolhas no celular. A partir desse conhecimento prático temos a possibilidade de criarmos formas de expressão mais afetivas, divertidas: multimídia. Suavizamos, despertamos, trocamos através dessa jovem tecnologia móvel, nossa impressões, sensações, emoções, pensamentos, enfim uma série de manifestações.

Proponho uma Campanha de arte no telefone celular, móvel para incentivar esse tipo de comunicação afetiva e exercício da criatividade. Esse aparelhinho pode ser tb uma excelente ferramente para educação, pelo fato de poder acessar a internet. Esse tipo de iniciativa, com crianças e adolescentes é uma maneira de formar consumidores mais preparados, exigentes e criativos. Que possam escolher aquele aparelho que lhe é mais conveniente, atendendo assim as suas necessidades.
Essas são algumas questões em aberto para continuarmos a pensar a respeito dessa nova tecnologia, e seus efeitos sobre a vida de todos nós.
A segunda frase: “Quando estava presa em casa doente, ganhei mobilidade com o computador.”, explicita a versatilidade de um aparelho fixo, que possibilita criar, escrever/reescrever, copiar/colar, deletar, voltar, desenhar, fazer planilhas, contar, trocar informações pelo ciberespaço, falando com pessoas, amigos, família em qualquer lugar do planeta. Visitamos museus virtuais, pagamos contas, pesquisamos em bibliotecas e instituições online, bate- papos, namoro, sexo e etc. e tal...
“Eles – esses recursos e discursos - instauram uma nova lógica: a lógica do excesso, da integração, da interação, do raciocínio ágil, da velocidade, do autodidatismo, da ajuda mútua à distância, da colaboração, da informação sem propriedade, do acesso fácil a qualquer tipo de informação, da ausência de censura, da ausência de controle central, da democracia, da ruptura de barreiras e fronteiras, etc.”1
O universo virtual é ilimitado, vasto, sem fronteiras e regras, onde tudo é permitido. Viajamos pelos mais variados lugares, sites, sem sair do lugar. Isso realmente é impressionante. Recebemos informações a cada minuto. Essa incrível máquina transformou radicalmente o mundo, a noção de tempo, os relacionamentos, o entretenimento, a educação, entre muitas outras coisas que ainda não sabemos.
Estamos vivendo uma outra “ordem mundial”, o conceito de tempo mudou, o sentido de linearidade acabou. Atualmente o tempo é dividido entre o “real” e o “virtual”.
“A modernidade, fundada pela Razão, estabelece mecanismos de controle para que as paixões não governem as ações humanas, para que o homem, racionalmente, organize o mundo e a natureza. Esse modelo entra gradativamente em colapso, instalando uma crise de paradigma na contemporaneidade.” 2
Após a Segunda Guerra (1939- 1945), a sociedade ocidental viveu acontecimentos jamais vistos, inéditos como: a Guerra Fria, o computador, os veículos de comunicação de massa, a sociedade de consumo, o crescimento das grandes redes de auto- estrada e o advento da cultura do automóvel – Estes são alguns traços que pareciam demarcar uma ruptura radical com a antiquada sociedade anterior a guerra.
A década de 60, sob vários aspectos, promoveu o nascimento da pós- modernidade, que estava estreitamente relacionada à emergência dessa nova fase do capitalismo avançado, multinacional e de consumo.
Destacarei alguns traços característicos da pós- modernidade segundo Fredric Jameson (texto “ Pós- Modernidade e Sociedade de Consumo”3): Reações específicas a formas canônicas da modernidade, desgaste das fronteiras que demarcam a diferença entre cultura erudita e cultura popular, dissolução de fronteiras entre as disciplinas ( textos teóricos interdisciplinares, exemplo Michel Foucault), emergência da sociedade pós- industrial (a sociedade das mídias, do espetáculo, do capitalismo multinacional, a sociedade de consumo), o pastiche (mimetismo de outros estilos, paródia que perdeu o senso de humor), a Morte do sujeito ( o fim do individualismo como tal, na sociedade dos mídias, tudo é compartilhado), a moda Retrô, a transformação da realidade em imagens e a fragmentação do tempo em uma série de presentes perpétuos (uma relação esquizofrênica com a realidade).
Antigamente o homem era submetido às leis divinas, a partir da modernidade passamos a ser responsáveis e sujeitos. Com o desenvolvimento da genética e com a clonagem humana, nos tornamos criadores. Se antes éramos criaturas, hoje somos criadores e criaturas prepotentes. Não sabemos aonde isso tudo irá nos levar, mas temos consciência de que jamais seremos os mesmos, que o passado fica realmente muito distante de nós. Não dá para pensar a vida e o homem pós- moderno com a mesma visão do homem moderno. Somos seres desamparados, atravessados pelas descobertas irreversíveis da ciência.
Finalizando a segunda frase, falando dos benefícios dessa maravilhosa invenção. O computador foi um instrumento fundamental na minha recuperação, um importante co-terapeuta. Permitiu-me criar textos, desabafar, aprender e ter prazer em viajar pelo universo online. Ajudou-me a colher dados e a me filiar a fundações internacionais que pesquisam a respeito dessa moléstia a qual tinha sido diagnosticada: doença de Crohn. O fato de ser desconhecida, rara e de não ter ainda uma cura, me deixou completamente assustada e preocupada. Mas o esclarecimento que tive através do contato com essas instituições e com pessoas portadoras da mesma enfermidade também contribuiu intensamente na minha recuperação, assim como, descobrir o prazer de “navegar em mares nunca dantes navegados”, sem precisar sair de casa.


Bibliografia:

1- NICOLACI-DA-COSTA, Ana Maria. Na malha da rede: os impactos íntimos da internet, Rio de Janeiro, Campus, 1998.

2- LONGO, Leila. “Da modernidade à pós- modernidade” , Rio de Janeiro, Universidade Santa Úrsula. S/ data.

3- JAMESON, Fredric. “Pós- modernidade e sociedade de consumo”, New Left Review, n° 146, julho- agosto, 1984.

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